O livro Escravidão Volume 1 é a primeira parte de uma trilogia em que o jornalista Laurentino Gomes aborda esse período sombrio da nossa história.
O projeto é fruto de uma pesquisa que levou 6 anos, a leitura de mais de 200 livros e viagens a 12 países.
“O Brasil tem seu corpo na América, mas sua alma na África”
Padre Antônio Vieira, 1961
O Jornalismo e a história
Laurentino Gomes é jornalista e escritor dos best-sellers 1808, 1822 e 1889. Teve como mérito tornar a história do Brasil, que geralmente é vista como chata, em uma leitura curiosa e atraente.
Sua escrita é de fácil entendimento e flui muito bem.
Por ser um escritor de sucesso e, por isso, lido por muita gente, foi natural ter recebido críticas de alguns historiadores, já que sua formação de fato é jornalismo.
Apesar disso, Laurentino nunca se vendeu como um historiador, e ele deixa isso muito claro em suas apresentações.
Muitos dos fatos que o autor traz são, sim, embasados em trabalhos de historiadores. A sua obra é séria e foi resultada de uma longa pesquisa. Trabalhos assim como o de Laurentino merecem ser valorizados, pois tornam a história em algo de de fácil acesso, que rompe barreiras das universidades.
Do leilão a Zumbi
O projeto Escravidão é dividido em três partes:
- O Volume 1, lançado em 2001. Narra os fatos do primeiro leilão de cativos em Portugal até a morte de Zumbi dos Palmares;
- O Escravidão Volume 2, publicado em 2021. Vai da corrida do ouro em Minas Gerais até a chegada da corte de Dom João;
- Já o Volume 3, lançado agora em 2022, cobre desde a independência até a Lei Áurea.
Logo no começo do primeiro livro, temos uma introdução sobre o conceito de escravidão na história humana e como ela foi diferente com o povo africano.
No mundo inteiro milhões de seres humanos foram escravizados, seja Babilônia, Império Romano, Egito antigo e na expansão do Islã na idade média.
Os escravos eram de todas as regiões e linhagens étnicas, como os eslavos, de olhos azuis, que deram a origem à palavra “escravo”.
Mas nada se compara com os três séculos e meio de atrocidades cometidas com os povos africanos.
Também, pela primeira vez, escravidão se tornou sinônimo da cor de pele negra, origem da segregação e do preconceito racial que ainda hoje assustam e perturbam a convivência entre as pessoas em muitos países, caso do Brasil e dos Estados Unidos.”
Uma passagem interessante do livro mostra como o preconceito europeu reduziu a grandiosidade dos reinos e cidades africanas, chamando-as de tribos. E, na realidade, a organização de algumas cidades africanas por seu tamanho, importância e poder, deveriam ter sido chamadas de Impérios.
O livro conta todo o processo da escravidão, desde a compra de escravos em territórios africanos até a venda para o comprador final. Seja no Brasil ou América como um todo.
Mas o Brasil foi o lugar que mais recebeu escravos: foram 5 milhões de pessoas, 40% do total de 12,5 milhões na América.
Também não poderia ficar de fora as descrições das viagens nos temidos navios negreiros. As condições precárias, má alimentação e castigos eram constantes. A porcentagem de mortes era tão alta que tubarões mudavam suas rotas migratórias para acompanhar o navio à espera dos corpos lançados ao mar.
Em terra firme, os escravos eram leiloados ou levados para compradores particulares. A maioria trabalharia até sua morte nos engenhos de açúcar. Posteriormente também seriam usados em minerações e plantações de café.
O final do livro é reservado para falar de Zumbi, seu personagem histórico e o mito criado envolto dessa figura. A sua importância para a resistência negra também é discutida.
Poucas fontes sobre Zumbi tornam esse tema muito polêmico e acredito que para algumas pessoas esses capítulos não agradarão.
Um tema necessário
Leitura fácil pelo entendimento, mas difícil pelas informações sobre esse terrível momento de nosso país, com fatos horríveis e pesados, mas que deveria ser de conhecimento de todos.
O objetivo principal do livro Escravidão é ser introdutório, informar previamente, e atiçar a curiosidade para leituras mais profundas e em outras fontes, caso assim o leitor deseje.
“Eu considero a escravidão o assunto mais importante da história do Brasil. Tudo que já fomos no passado, o que somos hoje e o que seremos no futuro tem a ver com as nossas raízes africanas e a forma como nos relacionamos com elas. E essas raízes são mais profundas do que se imagina”
Laurentino Gomes às vezes deixa meio ambíguo sua opinião sobre alguns assuntos, e para sanar algumas dúvidas tive que ir buscá-las em entrevistas ou redes sociais do autor.
Em alguns momentos ele cita algumas controvérsias que carecem de fontes, mesmo afirmando anteriormente que existem pouquíssimas informações sobre tal assunto.
Como exemplo, o debate sobre Zumbi dos Palmares ter tido ou não escravos, Laurentino vai contra o consenso dos historiadores e afirma sem cerimônias que, sim, Zumbi era dono de escravos.
Apesar disso tudo, o autor reconhece seu lugar e sabe que seu livro não é uma obra definitiva e nem de longe foi algo original. Seu trabalho, no geral, merece todos os elogios que recebeu. Afinal, compilar gigantescas informações em capítulos concisos não foi tarefa fácil.
Minha avaliação: ⭐⭐⭐⭐
📌 Você pode ler uma prévia do livro na Amazon.
Recomendo a todos que queiram conhecer mais sobre o assunto. Li o segundo volume e também recomendo: veja a resenha de Escravidão Volume 2.
Muito boa a resenha!! Parabéns!!
O livro citado de Laurentino Gomes sem dúvida é essencial para quem almeja conhecimento, uma leitura simples e de fácil entendimento, desfaz alguns mitos ensinados em salas de aulas e da própria academia.Gomes nos leva a um pensamento crítico em que escravidão não é motivo de cor sim a ganância, e quantos atores envolvidos neste processo recomendo a leitura para quem quer se libertar da escravidão da ignorância.