Confesso que não sou a maior fã de drama, e olha que com este aqui eu chorei até a alma, mas amei tanto Lágrimas de Amor e Café que panfleto esse livro para todo mundo.
Afinal, um romance de época que se passa no Brasil merece ganhar visibilidade, né?
“Os sorrisos dela eram somente para ele. Essa era mais uma loucura em que Vincenzo gostava de acreditar.”
Lágrimas de Amor e Café, Babi A. Sette
Além dos bailes londrinos dos romances de época
Eis o principal motivo que me levou à leitura: o contexto histórico.
Claro que eu sempre ouvi falar muito bem dos romances da Babi A. Sette, mas eu corri mesmo para conhecer um deles quando me contaram que “Lágrimas de amor e café” era brasileiro do início ao fim. Não apenas por ser escrito por uma autora nacional, mas por remeter a um tempo que, muitas vezes, é esquecido pelos leitores – uma realidade para lá de diferente dos bailes londrinos.
Ambientado no Brasil, no início de 1900, o livro traz a história cruel do que foi a vinda dos imigrantes italianos para cá na época do café. Quando deixavam suas casas e famílias do outro lado do oceano buscando um sonho de vida melhor… E encontravam pobreza, maus tratos e condições de trabalho insustentáveis espelhando o “final” da escravidão.
Então é puro drama? Não, calma! Eu sofri igual a uma condenada, porém a história é linda, os personagens apresentados são cheios de dilemas, questionamentos e reflexões, e o romance que surge é emocionante!
“A riqueza talvez fosse a culpada por matar mais sonhos do que o fracasso já fora capaz; a ausência de oportunidade vinha casada com a falta da primeira. Não era por almejar riquezas que o povo sofria, e sim porque a escassez de recursos destrói sorrisos, sufoca a esperança, esmigalha vontades. Nenhum homem precisa de riqueza para ser feliz — Vincenzo sabia —, mas todos necessitam de esperança.”
Deixo o alerta para gatilho de abuso: embora não tenha nenhuma cena descrita dos abusos sexuais que ela sofre, a protagonista deixa claro como os momentos conjugais são difíceis, que não gosta do toque do marido e como não tem voz para rejeitá-lo na cama. Além de mencionar momentos em que apanha do Barão por não obedecê-lo e de ser humilhada verbalmente na própria casa.
O romance que tinha tudo para ser Romeu e Julieta, mas que deu certo
Ficou preocupada com a primeira parte do texto e está pensando em desistir? Pois pode parar bem aí, porque se não tiver final feliz, a indicação não vem de mim 😂😂.
Juro que vale a pena. Sem contar que se vocês lessem sobre a primeira vez que o mocinho a vê… ah, depois disso é um caminho sem volta!
“Ouvindo os protestos do irmão, ele se esgueirou entre a proa e os cabos, apoiando os pés em dez centímetros de piso, poucos centímetros de tábuas que o separavam de um mergulho no oceano gelado.
— Stronzo! Estúpido! — o irmão protestou. — Volte seu imbecil!
[…] Vincenzo ergueu o braço o máximo que pôde e, enfim, alcançou o lenço.”
Angelina é uma jovem doce, apaixonada por contar histórias, preocupada com a família e com uma alma feita de sonhos.
Entretanto, sendo uma mulher em 1900 (só lá, né) e colocando a família em primeiro lugar, ela é “vendida” em casamento para um homem que, à primeira vista, parecia um galante fazendeiro, cheio de promessas e bajulações. Mas, no segundo que embarcam no navio para o Brasil, se mostra um monstro. Um ser desprezível que a abusa física e psicologicamente.
Sozinha em um país novo, sem ninguém que a apoie, dê credibilidade ou algum senso de proteção, ela se vê presa numa gaiola de ouro. Sendo a “senhora da casa grande” que precisa esconder as marcas deixadas pelo marido toda vez que a procura.
Não muito longe dali, Vincenzo passa seus dias trabalhando no cafezal — passando fome e lutando por um futuro para ele e o irmão — e às noites sonhando com uma certa moça do navio que o trouxe da Itália.
Sim! Vincenzo é um romântico incorrigível que se apaixonou à primeira vista, mas que não conseguiu encontrá-la depois que atracaram. Qual a sua surpresa quando descobre que trabalha para ela…
Geralmente eu não leio livros sobre traições. Nunca, na verdade. Mas este aqui eu realmente considero diferente.
Nossos protagonistas são jovens fortes, sonhadores, que mereciam muito mais do que a vida lhes reservou, e que buscarão consolo, amor e parceria juntos. Esse romance nasce nas pequenas atitudes do dia a dia, é fortalecido por planos de liberdade, e floresce às escuras, com medo de serem mortos pelo Barão.
E como não poderia deixar de ser, temos uma sucessão de referências ao casal Romeu e Julieta — reforçadas pelo amor da mocinha pela literatura e por um presente de família todo especial que eu fiquei babando só de imaginar.
“— Dio me proteja — pediu antes de começar a subida.
Vincenzo em Lágrimas de Amor e Café
Não segurou um sorriso fora de contexto ao perceber a ironia ou coincidência daquela cena: subir uma varanda pendurado em uma trepadeira, correndo o risco de ser visto e morto, como somente Romeu teria coragem ou falta de bom senso para fazer.”
Ah, e sobre o amor da Angelina por livros, gostaria de deixar uma observação especial para como eu achei tocante o apoio e a admiração do Vincenzo pelo sonho dela de se tornar uma escritora. Inclusive, é assim que eles se aproximam, através dos seus manuscritos. Sendo a busca pelos seus sonhos o elemento em comum responsável por todos os encontros e desencontros do casal.
Minha opinião de Lágrimas de Amor e Café
Foi um livro favoritado.
A escrita da Babi é extremamente fluida e as descrições me transportaram para os cenários da fazenda, mas, mais que isso, o que me encantou foi ela falar de temas pesados de uma forma leve.
Ela soube respeitar a dor dos personagens e escrever uma narrativa que me impelia a continuar, que aguçou a minha curiosidade para saber como (ou se) eles ficariam juntos. O que considero um feito e tanto porque romances envolvendo drama, às vezes, demandam uma leitura mais espaçada para lidarmos com os fatos com mais tempo.
E no que diz respeito ao contexto histórico, fiquei emocionada pela autora trazer a realidade dos imigrantes italianos para uma obra com potencial para atingir um público que nunca teve contato com essa parte da nossa história. Talvez eu esteja lendo demais nas entrelinhas, mas considerei uma homenagem.
Sem contar que o romance entre os protagonistas é lindo! Um relacionamento que realmente nasce da confiança e do carinho e que nos faz querer encontrar um Vincenzo por aí.
Quem é Babi A. Sette
Babi A. Sette é brasileira, mora em São Paulo, e possui 9 livros publicados. Sua primeira obra foi “Entre o amor e o silêncio”, de 2014, mas o reconhecimento veio mesmo com “A promessa da rosa” e com “Senhorita Aurora” lançados nos anos seguintes.
Embora alguns dos seus romances sejam contemporâneos, é mais conhecida pelos romances de época.
Amei a resenha. Faz ter vontade de ler o livro.
O romance é lindo e a leitura super fluída! É uma ótima recomendação para abrir o ano com um favorito.
Muito boa a resenha! Feliz também que é um romance nacional que conta um pouco da nossa história
Não tem como não lembrar de Terra Nostra kkk
Muito boa a resenha!! Parabéns Gabi!!